Desde que ‘A Substância’, estrelado por uma Demi Moore aterrorizante e brilhante, arrebatou os festivais de cinema e cerimônias de premiação mais prestigiados com sua crítica violenta ao culto à juventude e ao corpo feminino, o horror corporal retornou com força total ao debate cinéfilo. Este não é um gênero para os fracos: envolve ver o corpo físico se deformar, se contorcer e se corromper, mas, por trás de todo o grotesco visual, muitas vezes se esconde uma poderosa crítica social. Este tem sido o caso, de ‘A Mosca’, de David Cronenberg, ‘Titane’, ‘Possessor’ e o já mencionado ‘A Substância’.
Mas nem todas as produções exigem um choque visual extremo. Juntos, o filme de estreia do diretor Michael Shanks segue um caminho diferente: o horror corporal como uma metáfora para a codependência emocional, surpreendentemente envolto em nuances de comédia ácida que acentuam ainda mais o absurdo (e a dor) de amar demais.

Estrelado por Alison Brie e Dave Franco — que, além de atuarem como um casal em crise, são casados na vida real — ‘Together’ é uma jornada irreverente e emocionante que vai do cotidiano ao puro pesadelo.
Sobre o que é a história?
Millie (Alison Brie) e Tim (Dave Franco) decidem deixar a cidade para trás e se mudar para uma cidade pequena na esperança de resgatar seu relacionamento, que, depois de uma década juntos, começou a se deteriorar, tornando-se uma rotina estagnada em vez de um vínculo amoroso.
Ela, uma professora comprometida, vê nesse recomeço uma oportunidade não apenas de curar o relacionamento, mas também de se reconectar com sua vocação em um ambiente mais humano. Ele, um músico frustrado, vive imerso em uma crise existencial que o distancia cada vez mais de seus sonhos e de sua namorada.

Para ambos, a mudança representa um último esforço: uma tentativa desesperada de recuperar a chama, a intimidade e o propósito. Mas o que parecia um caminho para a cura logo se transforma em uma experiência sufocante, onde a conexão entre eles assume formas cada vez mais questionáveis.
Quando estar juntos é uma maldição
Apesar de uma premissa aparentemente simples, Juntos rapidamente evolui para o desconcertante. Depois de ficarem presos acidentalmente durante a noite em uma caverna misteriosa, algo muda dentro deles. Uma força inexplicável começa a alterar grotescamente seu vínculo, a ponto de seus corpos começarem a se “fundir”, como se uma presença invisível os compelisse a permanecerem juntos, independentemente da dor física ou do sofrimento emocional que isso acarreta.

É aqui que começa o verdadeiro brilhantismo deste filme: a visão repugnante de seus corpos unidos não é apenas um recurso grotesco do gênero, mas uma poderosa metáfora para a codependência. A situação pode desencadear risos desconfortáveis quando o ridículo se mistura com o arrepiante, e o filme consegue retratar a ansiedade, o abandono e a necessidade tóxica que sentem um pelo outro.
Um casal real e distorcido
Alison Brie e Dave Franco são, sem dúvida, uma das maiores realizações deste filme. A química entre eles é inegável; seus diálogos fluem com a naturalidade e a tensão típicas de um casal real em crise, conseguindo transmitir tanto a fragilidade quanto a cumplicidade de seu relacionamento.
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Além disso, sua cumplicidade se estende ao humor ácido e distorcido que traz camadas adicionais de autenticidade e profundidade aos seus personagens.
Em última análise, ‘Together’ não é um filme para todos, mas sua abordagem é muito mais inteligente do que sua aparência grotesca pode sugerir. Embora use imagens marcantes, o que é realmente perturbador é a pergunta: quanto de si mesmo você está disposto a perder para ficar com alguém?

