A estudante de medicina Larissa Moraes de Carvalho, de 31 anos, que ficou em estado vegetativo após passar por uma cirurgia ortognática, para corrigir alterações na mandíbula, saiu de casa pela primeira vez desde que recebeu alta do hospital, em Minas Gerais. A jovem passou por um eletroencefalograma, que visou mapear sua atividade cerebral. Enquanto isso, a família dela luta na Justiça para que ela faça um tratamento chamado neuromodulação, que foi negado pelo convênio.
ANÚNCIO
Pai da estudante, Ricardo Carvalho disse, em entrevista ao jornal “O Globo”, que a família ficou apreensiva com a primeira saída de casa de Larissa, ocorrida na quarta-feira (12), mas ela precisou ser levada de ambulância até uma clínica para o exame.
“Foi a primeira saída depois que ela veio para casa, então a gente fica tenso porque não sabemos como vai ser. Ficamos preocupados, mas foi tudo organizado com a técnica de enfermagem também e correu tudo bem. E também percebemos que a Larissa voltou [para casa] muito tensa, sentimos a tensão. Ao chegar em casa, colocamos ela na cama para relaxar um pouco”, relatou o pai.
O pai afirma que Larissa parecia estar bem atenta durante o exame, porém, por conta do estado em que ela está, não há como saber se ela tem consciência. “Para nós, é muito difícil entender o que ela está compreendendo porque ela não fala, a gente tem apenas o olhar dela”, disse Ricardo.
Larissa tinha a indicação de realizar a cirurgia ortognática desde a adolescência, mas, já adulta, passou três anos pesquisando sobre o assunto. A operação foi realizada no dia 16 de março de 2023, na Santa Casa de Juiz de Fora, em Minas Gerais. Porém, logo após o procedimento, ela sofreu uma parada cardiorrespiratória, que causou lesões cerebrais, deixando a estudante em estado vegetativo.
Depois do episódio, Larissa ficou um mês internada no Centro de Terapia Intensiva (CTI), onde foi diagnosticada com pneumonia e infecção urinária. Depois disso, foi levada para um quarto, onde permaneceu até março deste ano, quando teve alta.
A família conseguiu na Justiça que o plano de saúde custeie o homecare para a jovem, mas recebeu a negativa sobre a neuromodulação, que consiste em modular a atividade do sistema nervoso por meio de estimulação elétrica fraca ou magnética.
ANÚNCIO
O pai diz que o plano de saúde da Prefeitura de Juiz de Fora, onde ele trabalha, afirma que o tratamento não está no rol de procedimentos médicos com cobertura. Como a terapia custa mais de R$ 400 mil, ele teve que recorrer novamente à Justiça.
O caso foi analisado pela Justiça mineira e negado na 1ª Instância, mas eles recorreram e agora aguardam uma decisão da 2ª Instância. Não há prazo para divulgação do resultado.
“Durante a cirurgia, ela ficou sem oxigênio no cérebro e isso causou sequelas. As áreas afetadas não vão ser recuperadas, mas o tratamento de neuromodulação vai ajudar nas áreas não afetadas. (...) Sabemos da gravidade, mas queremos a recuperação dela”, ressaltou Ricardo.
O plano de saúde não comentou o assunto. Nesta semana, a Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados aprovou a inclusão da neuromodulação no rol de procedimentos a serem feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, o projeto de lei vai passar por outras comissões até ser votado em plenário.

Cirurgia ortognática
Conforme a família, após a cirurgia, a estudante foi levada a um quarto no 9º andar da Santa Casa, mas logo sofreu uma parada cardiorrespiratória. “Larissa chegou ao quarto já desacordada, quando me pediram para sair rapidamente. Minutos depois começaram a chegar muitos profissionais. Foram os piores momentos da nossa vida, pois ninguém nos dava respostas do que aconteceu na cirurgia”, afirmou o pai.
O prontuário médico indicava que a jovem saiu da sala de Recuperação Pós-anestésica (RPA) às 17h45, quando foi levada ao quarto. Quando chegou lá, às 18h02, já estava em parada cardiorrespiratória. Durante o percurso, que levou 17 minutos, nenhum profissional teria notado que algo estava errado com Larissa, que acabou com lesões neurológicas.
Depois disso, a jovem ficou em estado vegetativo. “Ela não está se comunicando. Em alguns momentos, ela até busca fonte sonora. A gente chama, ela vira o pescoço, e olha. Tem horas que parece que está em outro mundo. Tem momentos mais presentes, com o olhar. Ela não mexe, não se movimenta”, falou a mãe, a coordenadora pedagógica Maria Cristina de Carvalho, sobre o estado atual da filha.
Investigação
Os pais procuraram o Ministério Público de Minas Gerais e denunciaram o caso. Em setembro do ano passado, o promotor Jorge Tobias de Souza determinou a abertura de investigação pela Polícia Civil e o encaminhamento do caso ao Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais.
Procurada, a Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora informou que, uma vez já instaurada ação na Justiça, “o hospital não fará quaisquer comentários sobre o assunto fora dos autos”. “Reiteramos nosso compromisso com a transparência e a qualidade no atendimento prestado à toda comunidade ao longo de nossa história, que soma quase dois séculos”, disse a unidade de saúde.
Já o Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais ressaltou que o caso é investigado, “sendo respeitada a ampla defesa e o contraditório”. O órgão explica, ainda, que “todos os procedimentos tramitam sob sigilo, conforme previsto no Código de Processo Ético-Profissional.”
A Polícia Civil, por sua vez, segue investigando o caso e já colheu depoimentos de testemunhas. Porém, não repassou outros detalhes para não atrapalhar os trabalhos.