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Torcedoras do Santa Cruz se unem contra o machismo no futebol

Acervo Pessoal

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Se uma torcedora do Santa Cruz que for ao estádio do Arruda precisar ir ao banheiro durante um jogo, irá encontrar lá uma caixinha contendo todos materiais básico que uma mulher precisa para sua higiene íntima. Papel higiênico, absorvente e lenços umedecidos estão lá para quem precisar, mas não foi a diretoria do clube do Recife que colocou eles ali, e sim um grupo que decidiu que era hora das mulheres ocuparem os estádios: o Movimento Coralinas.

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Mas a caixinha do banheiro é apenas uma pequena parte, talvez a menor, dos que significam as Coralinas. Cansadas de sofrerem assédio toda vez que iam ao estádio, um grupo de torcedoras do Santa Cruz decidiu criar um grupo para que as mulheres pudessem frequentar o Arruda sem medo. Assim surgiu, em agosto de 2016, o Movimento Coralinas. Hoje, um ano depois, elas já são mais de 70 e seguem crescendo, combatendo o machismo que ainda impera no ambiente do futebol e com o lema “Lugar de mulher é onde o Santa estiver”.

As Coralinas não se consideram uma torcida organizada. São mais do que isso: um movimento político e que assim dialoga diretamente com a diretoria coral reivindicando melhores condições nos estádios para as mulheres e mais políticas voltadas para as torcedoras. Seus pedidos vãos desde a confecção de uniformes femininos até a retomada do time de mulheres do clube. Elas querem que reconheçam a importância do papel da mulher enquanto torcedora. Assim como os homens, elas vão ao Arruda para apoiar o Santa durante 90 minutos. As Coralinas também fazem campanhas que conscientizam sobre a violência de gênero e outras ações. Cobram para as mulheres a mesma estrutura dada aos homens. Nada mais justo.

A ideia da caixinha do banheiro veio pela falta desses materiais no estádio do Arruda. A caixinha é colaborativa, e a doação dos produtos é incentivada pela grupo. A preocupação com o social é grande também entre as Coralinas e elas já chegaram a fazer uma campanha de arrecadação de alimentos, roupas e água para as vítimas da chuva do estado de Pernambuco. No final do ano, pretendem fazer um dia de empoderamento feminino para as moradoras da comunidade em torno do Arruda, com palestras sobre o tema e oficinas de beleza. As coralinas querem a inclusão das mulheres no ambiente do futebol.

“Falaram que deveríamos nos adequar”

O Movimento Coralinas tem um núcleo de dez diretoras. Elas são as responsáveis por unir as mulheres em prol do Santa Cruz. Mas isso não aconteceu de maneira fácil. Elas tiveram que encarar de frente muitos machistas e assédios até conseguirem marcar seus lugares no Arruda. Maiara Melo, uma das líderes coralinas, também revela que elas não compactuam com músicas preconceituosas nas arquibancadas.

“Já tentaram se impor diante da gente, falando que nós deveríamos nos ‘adequar’. Falavam ‘O que feminismo tem a ver com futebol?’, mas essas situações hoje já foram contornadas. Queremos empoderar as mulheres, que elas possam ir para um jogo como uma forma de lazer, sem ter que se preocupar com stress e dor. Apesar de não sermos uma torcida organizada, temos nossa camisa do grupo, e usamos para que outras mulheres dentro do estádio possam nos identificar. Muita gente chegou até a gente assim”, disse ela em entrevista ao Portal da Band.

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Braços cruzados contra o preconceito

O Movimento ressalta que o machismo está tão enraizado na cultura do futebol, que muitos tipos de assédio, que acontecem a toda hora nos estádios, às vezes se passam por brincadeira, algo inocente. Mas elas não compactuam com isso, e quando o preconceito vem em forma de música na arquibancada, as coralinas cruzam os braços e tentam colocar na mente das torcidas organizadas que esse tipo de cântico é ultrapassado.

“O grupo surgiu justamente da necessidade das mulheres que queriam frequentar os estádios e não tinham com quem ir. Os estádios, qualquer um no Brasil, são ambientes machistas. Existem assédios de muitas formas, muitas meninas já foram assediadas. Algumas maneiras de assédios são mais sutis, como as músicas que as torcidas cantam na arquibancada com teor machista, homofóbico e isso às vezes passa despercebido. Quando isso acontece, nós não cantamos. Nós cruzamos os braços e reclamamos. Claro que a maioria das vezes não somos atendidas, mas temos ganhado muito apoio dentro do Arruda”, comentou.

Pequenas vitórias, grandes gestos

O grupo conta que já realizaram reuniões com o presidente Alírio Moraes para cobrar melhores condições para as torcedoras e outras questões. De acordo com Maiara, o mandatário coral tem se mostrado favorável a maioria de suas reinvindicações, mas diz que outras não podem ser feitas por conta da atual situação financeira do clube, que passa por dificuldades.

Neste ano, já conseguiram pequenas vitórias, como a confecção de camisas femininas para as torcedoras. Se ainda não conseguiram a retomada do time feminino do Santa Cruz, elas podem se orgulhar de ações que extrapolam o estádio do Arruda e até mesmo o time que amam: a da arrecadação de doações  de alimentos, roupas e água para as vítimas das chuvas que atingiram a região da Mata Sul de Pernambuco.

“Cobramos muito da diretoria algumas coisas, como mais atenção ao público feminino e retomada do time feminino, que foi extinto quando acabou a necessidade de todos os clubes terem equipe masculina e feminina. Falamos direto com o presidente, que tem se mostrado a favor de muitas coisas que pedimos. No caso do time feminino, ele diz que não pode por conta de questões financeiras, mas queremos a equipe de volta, é importante. Já conseguimos que o Santa produza camisas femininas, porque isso não acontecia. Quando ainda era patrocinada pela Pênalti, fizemos um tuitaço pedindo camisas femininas. Agora, com a marca própria, toda camisa lançada também tem a versão feminina, isso já é um avanço. Fora de campo, fizemos uma ação para arrecadar doações para as vítimas das chuvas que atingiram o estado recentemente”, contou Maiara.

Arruda lotado de mulheres

As Coralinas querem fazer algo não só pelas mulheres, mas pela comunidade também, que consideram tão importante quanto o Santa Cruz. O que elas querem é simples: igualdade de tratamento e um Arruda lotado de mulheres.

“A área do entorno do Arruda é muito pobre, e queremos fazer no final do ano um dia de empoderamento. Um dia com ações de beleza, palestras, para que todas as mulheres possam entender a importância e se conscientizar que elas também têm os mesmo direitos que os homens. É uma ação que queremos fazer para a comunidade.  Fora isso, queremos cada vez mais mulheres com a gente. Queremos o Arruda lotado de mulheres”, concluiu Maiara.

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