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‘Liberdade não significa que você possa fazer o que quiser’, diz Antônio Fagundes

Prestes a completar 70 anos e estrelar série, ator segue temporada de ‘Baixa Terapia’

Antônio Fagundes em 'Baixa Terapia', em cartaz no Tuca Divulgação

Fazendeiro, prefeito, professor, coronel, médico… Não tem como negar: o camaleão Antônio Fagundes é um dos grandes nomes da dramaturgia nacional, reconhecido Brasil afora por seus personagens, principalmente em telenovelas.

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Na próxima quinta-feira (18), ele comemora 70 anos, em plena atividade. No dia 15, estreia a minissérie “Se Eu Fechar os Olhos Agora”, na Globo. Enquanto isso, segue em temporada com a peça «Baixa Terapia», no Tuca (r. Monte Alegre, 1.024, Perdizes, sex., às 21h30, sáb., às 20h; dom., às 18h; R$ 100 a R$ 120). «Estivemos em 27 cidades no Brasil, por onde passamos lotamos a casa», conta orgulhoso. A produção está em cartaz há dois anos.

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Ele também é reconhecido por bancar suas próprias produções, seja no teatro ou mesmo no cinema. Ano passado estreou como produtor em «Contra a Parede», filme sobre conflitos éticos na política.

Fagundes conversou com o Metro Jornal sobre a situação atual da Cultura no país, o ofício do ator e «Baixa Terapia».

Você tem um histórico como produtor de teatro, experiência que, no ano passado, se estendeu também para o cinema, em «Contra a Parede». Como foi isso, atuar em frente e atrás das câmeras?

São experiências diferentes. Você tem que saber separar, senão quando você vai para a frente da câmera, acaba levando os problemas que teve atrás dela e vice-versa. Se você não sabe separar as funções, acaba fazendo uma bagunça. Eu sei separar.

O artista tem mais liberdade quando participa de uma produção independente, sem ser financiado por uma grande companhia?

Sempre! Constantemente, vemos obras de arte sendo proibidas porque o patrocinador não concordou. Isso, naturalmente, é uma censura – embora as pessoas não chamem assim. Se você tem que se sujeitar ao que uma determinada entidade diz o que você tem que fazer, é uma censura. Por outro lado, eu acredito na censura do mercado. Por exemplo, se eu faço uma peça e ela não agrada à grande maioria das pessoas que frequentam teatro, eu tiro essa peça de cartaz. Mas aí é o mercado que diz se funcionou, não existe uma entidade me proibindo de fazer. Se você está se submetendo a um patrocínio, as regras do patrocinador vêm junto e uma delas é que você só vai fazer o que ele quer que você faça.

A internet pode auxiliar a liberdade do artista?

A liberdade é uma coisa mal interpretada. Ela não significa que você possa fazer o que quiser, mas ter responsabilidade ao fazer o que você quer. Eu posso fazer o que eu quiser, desde que eu não interfira com a sua liberdade. Falar em liberdade é uma coisa idiota, porque a civilização surgiu a partir do fim da liberdade. É preciso abrir mão de parte da liberdade para ser livre.

A internet, me parece, virou um «samba do criolo doido». Todo mundo acha que pode fazer o que quiser, aí dá nisso, todo mundo sem nenhum dever, sem nenhuma responsabilidade. Resultado: fake news, agressões, opiniões sem embasamento e tudo isso que estamos vendo. Eu acho que a internet é um veículo extraordinário, mas que tem que ser usado com responsabilidade para ser livre.

Como você vê a questão da incorporação do Ministério da Cultura pelo Ministério da Cidadania?

Eu nunca liguei para isso, porque o que interessa não é o nome do ministério. [Não importa] se é secretaria ou conselho. O que interessa é que funcione para aquilo à que veio. Vai ter verba? Vai existir alguma política cultural por trás? Tem agido no sentido de formar público, de enriquecer o patrimônio cultural do país, fazer as companhias de dança funcionar, transformar o cinema em indústria? O que interessa é o que vai ser feito.

Você é otimista nesse sentido?

Eles estão aí há muito pouco tempo. Mas eu li uma entrevista outro dia com o secretário especial da Cultura [Henrique Medeiros Pires] e algumas posições dele me pareceram bastante razoáveis. Não sei se vão deixar ele fazer o que ele pretende, mas, se deixarem, talvez saiam algumas coisas interessantes daí. Vamos esperar.

Você concorda com os artistas que afirmam que a arte precisa ser sempre politizada?

Não, não concordo. A arte sempre é politizada. Ela não precisa ser, ela é. Algumas pessoas reclamam que a arte tem que ser engajada, o que é diferente de ser politizada. Engajada quer dizer «eu tenho que assumir um partido, eu tenho que ser de esquerda, de direita ou de centro». Isso eu acho que é horrível, porque se você é engajado, significa que tem uma carteirinha. Se você tem uma carteirinha, deixa de ser livre e deixa de criticar sua sociedade. E uma das principais funções da arte é criticar, registrar e documentar o seu tempo.

Como você construiu seu personagem em «Baixa Terapia»?

O processo de criação de um personagem envolve muita coisa, inclusive a vivência e a capacidade de observação e compaixão do ator. Eu sempre acho que uma peça, para funcionar, envolve muita compaixão de quem faz e de quem assiste. Se você é capaz de sofrer junto com um personagem, embora aquele problema que esteja sendo retratado não seja o seu, você está fluindo dentro daquela obra de arte. O trabalho do ator é o primeiro ato de compaixão antes de chegar ao público. E esse ato envolve toda uma formação psicológica, social, política e econômica do próprio ator. Como eu criei meu personagem? Foram 70 anos de experiência.

Geralmente, atores dizem que há uma certa flexibilidade com o texto de comédia. O texto de «Baixa Terapia» sofreu muitas mudanças nesses dois anos?

Não, a gente não faz isso, temos um respeito profundo pelo autor. Embora o elenco todo seja muito bom de improviso, combinamos, assim que começamos a ensaiar, que não improvisaríamos. A gente entendeu que o autor teve um trabalho maravilhoso de estruturação desse texto. O que tem de diferente é que muita gente vem ver quatro ou cinco vezes. Essas pessoas se surpreendem em como o espetáculo fica mais rico. Isso é muito bonito, isso é teatro. É vivo!

Vocês acabam de voltar de uma turnê em Portugal. Como foi a recepção do público de lá?

Foi excepcional. Nós recebemos, em dois meses e meio por lá, o equivalente a um ano e meio de público aqui no Brasil. Tivemos 150 mil espectadores aqui no Brasil, enquanto em Portugal, tivemos 50 mil em menos de três meses. Eu sou muito conhecido em Portugal, então isso também ajuda na divulgação, mas o grande sucesso mesmo vem do mérito do próprio espetáculo. Além de ser hilariante, ele também toca em temas bastante atuais e universais. Além de Portugal, também fomos para os Estados Unidos, em Orlando, Miami e Boston. Também teve uma reação muito boa.

Essa é a última vez que o público paulistano vai poder assistir a «Baixa Terapia»?

Nós estamos programados para ir até abril. Mas, tudo vai depender da fluência do público: se a gente começa a lotar novamente, continuamos em cartaz. Senão, quem viu, viu, quem não viu, fecha o caixão. E quem não viu realmente vai perder um grande espetáculo. É um texto especial, uma comédia hilariante. Ele tem duração de 1h30, mas normalmente a gente sai daqui após 2h, porque meia hora é só de risadas.

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