«Por favor, me salve como se eu fosse sua amiga», diz a jovem transportada numa maca no hospital fictício Grey-Sloan Memorial, que já teve o nome de Seattle Grace. O pedido é feito à médica que vai operá-la, depois do acidente numa montanha russa.
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A cena é da última temporada da série americana Grey’s Anatomy, um dos dramas de maiores sucesso da televisão americana desde a estreia em março de 2005.
A cada episódio, a médica Meredith Grey, interpretada pela atriz Ellen Pompeo, e os outros integrantes da equipe do hospital enfrentam o desafio de diagnosticar, operar e curar os pacientes em meio a dramas pessoais. Tudo isso em menos de uma hora.
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Essa representação da rotina de um hospital escola foi analisada num estudo publicado na revista cientifica Trauma Surgery and Acute Care Open (Cirurgia de Trauma e Cuidados Agudos, em tradução livre).
O objetivo dos pesquisadores do hospital St. Joseph, de Phoenix, no Estado do Arizona (EUA), era saber se a série é fiel à realidade e discutir como isso pode influenciar a percepção de espectadores e potenciais pacientes ao assistir ao seriado.
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O programa foi criado pela cineasta e produtora Shonda Rhimes, que também faz sucesso com outras séries – todas com fortes protagonistas femininas como Lições de um Crime (How to Get Away with Murder, no original em inglês) e Scandal.
Mas os pesquisadores escolheram Grey’s Anatomy para a análise pelo longo período que o seriado está no ar, pela popularidade – ela aparece quase sempre entre os 10 dramas mais assistidos da televisão americana – e por estar ambientado num hospital universitário urbano.
‘O efeito Grey’s Anatomy’
Para comparar a ficção com a realidade, os pesquisadores sistematizaram informações de 290 pacientes fictícios retratados em 269 episódios das 12 temporadas transmitidas entre 2005 e 2016.
Os dados foram comparados com lesões e doenças da vida real, sofridas em 2012 por 4.812 pacientes, segundo um banco nacional de dados de casos de traumatismo dos EUA.
Segundo a pesquisa, a taxa de mortalidade em Grey’s Anatomy foi três vezes maior que a vida real (22% contra 7%).
Os feridos graves, em contrapartida, tiveram uma taxa maior de recuperação na ficção. A metade dos pacientes do seriado passou menos de uma semana no hospital, enquanto apenas 20% dos pacientes reais analisados no estudo conseguiu ganhar alta em menos de sete dias.
«Os casos representados nos dramas televisivos tendem a ter resultados binários», explicou Jordan Weinberg, um dos autores do estudo, à Agência Reuters.
«Um paciente ferido é submetido a uma operação heroica urgente e não sobrevive, e os médicos, enfermeiros e membros da família ficam aflitos. Ou o contrário, o paciente sobrevive e no dia seguinte está sentado na cama completamente recuperado, abraçando os familiares.»
Segundo o estudo, as cirurgias da série também são mais frequentes e bem mais rápidas do que as feitas na vida real. Em Grey’s Anatomy, a maioria (71%) dos pacientes passou diretamente da emergência à sala de cirurgia. Na vida real, essa estatística alcançou 25%, segundo o artigo.
No seriado, poucos são os pacientes que vão, depois de operados, para unidades de tratamento intensivas, apenas 6%. Normalmente, quase um quarto dos pacientes é levado para UTIs após se submeterem a uma cirurgia.
Os pesquisadores concluem que «os dramas médicos da televisão americana tendem a mostrar enfermidades raras, manifestações estranhas de doenças comuns, lesões fantásticas ou extravagantes, e episódios de mortes em massa. Tudo dramatizado dentro de uma representação ‘realista’ de um típico hospital nos EUA».
Mas comparações indicam que o seriado não é exatamente fiel à forma como hospitais lidam com casos de trauma. E, para os pesquisadores, essas diferenças «podem dar lugar a uma percepção tendenciosa da realidade», uma vez que afetam pacientes e familiares.
É o que eles chamam de «efeito Grey’s Anatomy».