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Série de Karol Conká reacende polêmica sobre cancelamento; ‘força motriz do movimento é a hipocrisia’, diz especialista

Julgamento ganha foça na internet e pode afetar toda uma vida; entenda danos e saídas

Rapper brasileira Karol Conka Adolfo Santos Sonteria/Folhapress

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Lançada na última quinta-feira (dia 29), a série documental “A Vida Depois do Tombo” mostra a trajetória conturbada vivida pela rapper Karol Conká após o reality show Big Brother Brasil 2021. A participante foi eliminada do programa com índice recorde de rejeição: 99,17% dos votos. Teve de lidar com perdas financeiras relacionadas à publicidade e programas de TV e com uma imensa crise de imagem, que botou em risco toda uma carreira.

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O que Karol viveu foi o chamado cancelamento nas redes sociais. O desprezo na internet transbordou para a vida real. Condutas duvidosas dentro do BBB não foram bem aceitas aqui do lado de fora e, por isso, tal qual Judas em Sábado de Aleluia, ela foi «malhada em praça pública». Mas afinal, erros podem justificar a exclusão?

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Antes de mais nada, vale entender o conceito: o movimento de cancelamento se dá quando grupos se organizam para inviabilizar determinados corpos, discursos e posturas.

«Pensando em sociedade, devemos olhar para o cancelamento como uma reprodução de estruturas de poder e, quando falamos de poder, não devemos nos esquecer que ele se concretiza a partir da tríade raça, gênero e classe. É preciso discutir então quem são os corpos que verdadeiramente têm o poder de cancelar alguém», explica Ueliton dos Santos Alves, estudioso do tema e mestrando no programa de pós-graduação em Ciências da Informação no IBICT (Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia) da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

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Alves reforça que não há aspectos positivos quando se fala em cancelamento, nem mesmo ao pensar em uma suposta punição merecida. «Acreditar que jogar alguém no ostracismo é uma forma de estar ensinando é um dos equívocos mais cruéis que podemos cometer. Somos seres humanos, animais sociáveis, vivemos em grupo, a cultura é a nossa ferramenta de convivência, ela é o motor de cultivo para novos aprendizados e esses aprendizados só virão quando soubermos respeitar o diferente e as particularidades do outro. Não estou dizendo que temos que passar a mão na cabeça de quem erra. O que quero dizer é que precisamos buscar entender o outro, tentando cultivar formas para que ele aprenda com o erro.»

Internet: ambiente fértil para o ataque

Pexels

Apesar do termo recente, o cancelamento sempre existiu, porém ganhou repercussão no ambiente digital, segundo o estudioso. «Temos que encarar a internet como uma ferramenta, e seu papel nessa ideia de cancelamento é que ela ampliou a capacidade de juntar juízes para julgar quem deve ou não ser jogado no ostracismo.»

Para Alves, o princípio básico que deveria reger os comportamentos na web precisaria se basear na seguinte orientação: não faça na internet o que você não tem coragem de fazer na vida real.

Ainda segundo o especialista, regras são necessárias para evitar que a internet vire um verdadeiro tribunal. «A força motriz do movimento de cancelamento é a hipocrisia. Por acreditarem na ideia de anonimato nas redes, as pessoas ditas de bem cometem diversas atrocidades. Por conta disso, penso que devam existir mecanismos que mostrem a essas pessoas que a web não é terra de ninguém», diz.

Danos devastadores

Alves destaca que quem sofre com o cancelamento enfrenta efeitos devastadores, uma vez que perde convívio social, liberdade de tentar mudar, aprender com os erros e o acesso à cultura. As consequências podem ser eternas.

«Dou como exemplo a prisão. Uma pessoa que foi presa, independentemente de qual tenha sido o seu erro, carrega o estigma do cancelamento para sempre. Por mais que tenha pago sua pena, ela sempre vai ter dificuldade de se ressocializar, porque a marca ‘ex-presidiário’ nunca irá abandona-la», finaliza.

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