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Pandemia encoraja adoção de pets; decisão exige responsabilidade

Conheça Zeca, Chico e Margô, três cães que saíram de abrigos e hoje têm um lar cheio de amor

Adoção de pets na pandemia Arquivo pessoal

«Meus amigos dizem que não tem no mundo mãe melhor que eu.» Não, a psicóloga e pesquisadora clínica Renata Fumis, de 57 anos, não está se referindo a um filho humano, mas sim a suas «crianças», como ela gosta de chamar os pets Zeca e Chico, dois simpáticos cãezinhos que foram resgatados das ruas, amparados por uma ONG protetora de animais e hoje moram em uma casa confortável, repleta de brinquedos, comida e o mais importante: muito amor.

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Zeca tem 7 anos e está na vida de Renata há 5. Ela já havia tido cachorros antes, quando morava com os pais. Depois que os pets morreram, ela se dedicou ao trabalho e a viagens, mas não demorou para a vontade de ter um companheiro de quatro patas novamente falar mais alto. «Fui a uma feira de adoção e no momento em que vi o Zeca foi amor à primeira vista. Fui para casa, preparei sua chegada e, quando nos encontramos de novo, uma semana depois, ele me reconheceu e eu caí no choro. Ele já havia participado de várias exposições e nunca conseguiu uma família. Tenho certeza que ele estava me esperando.»

Arquivo pessoal

A pesquisadora conta que, de dois anos para cá, começou a pensar na possibilidade de um irmão para Zeca. A oportunidade veio há pouco mais de 15 dias. «Hoje trabalho boa parte tempo em casa e isso facilitou a adaptação do Chico, de apenas 8 meses. Confesso que se não fosse a pandemia, dificilmente teria adotado agora. Talvez tivesse que esperar um pouco mais», revela.

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O entusiasmo de Renata ao falar sobre os «filhos» contagia. «Eu sou apaixonada. Tê-los comigo é uma sensação única. É como dizem: se não nasceu de mim, nasceu para mim.»

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Assim como Chico, Margô também está de casa nova. Muito alegre e cheia de energia, ela – hoje com quase um ano – também encontrou a «mãe» por meio de uma ONG. A diferença é que foi pela rede social que a jornalista Giovanna Bambicini, de 37 anos, viu aquela carinha fofa e a barriguinha rosa irresistível pela primeira vez.

«Minha irmã segue alguns perfis de adoção de pets na internet, viu a foto da Margô e me encaminhou. Eu já vinha pensando em adotar, mas nunca tinha acontecido. Quando a vi, falei com o meu namorado e decidimos: vamos tentar», lembra a jornalista, que também trabalha atualmente no modelo home office.

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O processo demorou algum tempo. Giovanna conta que a ONG fez uma série de perguntas, como características da casa, onde a cadela ficaria no caso de viagens e o que aconteceria se o casal tivesse um filho humano. Quando finalmente o dia tão esperado chegou, a ansiedade tomou conta. «Nunca tinha segurado um filhote no colo. Aliás, até um tempo atrás, eu morria de medo de cachorro», confessa.

Hoje, Margô é a rainha da casa. «Se fosse por ela, dormiria na minha cama a noite inteira», brinca. «A responsabilidade é grande. É uma vida e, por isso, é preciso pensar antes de pegar um bichinho. Por outro lado, é muito amor, muito carinho. Ela é minha companheirinha», diz Giovanna.

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Para a jornalista, a pandemia também facilitou a tomada de decisão. «Em tempos normais, não sei como faríamos. Ela era bebê quando veio para casa e demandava muita atenção. Acredito que teria adotado de qualquer jeito, mas eu iria sofrer bastante ao sair e ter de deixá-la sozinha.»

Da rua para uma vida nova

As ONGs têm papel essencial no cuidado e encaminhamento de cães e gatos abandonados. O Clube dos Vira-Latas, por exemplo, foi o espaço de acolhimento de Zeca e Chico. O local funciona desde 2001 e hoje conta com 500 cachorros disponíveis para adoção. A instituição também ajuda felinos, que ficam em lares temporários.

Segundo Claudia Demarchi, presidente do Clube dos Vira-Latas, a adoção cresceu em torno de 70% durante a pandemia. Cerca de 150 animais ganharam um lar no período, entre filhotes, idosos e até deficientes. «Para todo pezinho há um sapatinho.»

Infelizmente, o abandono também aumentou. Isso porque, segundo Claudia, problemas como perda de renda e até mesmo o falecimento dos donos foram frequentes. Situações como essas fizeram com que os abrigos em geral ficassem lotados. Neste contexto, é importante lembrar que boa parte dessas instituições sobrevivem a base de doações e trabalho voluntário.

No caso específico do Clube dos Vira-Latas, os bichinhos acolhidos são todos vítimas de maus-tratos. Os profissionais reestabelecem a saúde dos pets, fazem a castração e há uma longa entrevista com o futuro tutor. «Não doamos cães para viver em correntes. Na ONG eles recebem carinho, brincam, se alimentam bem e assim devem continuar. Por mais amor que recebam conosco, acreditamos que a instituição é um lugar de passagem. Assim como crianças não deveriam viver em orfanatos, animais não devem viver para sempre em abrigos», afirma.

Divulgação/Clube dos Vira-Latas

Claudia elenca alguns pontos que validam uma adoção consciente. «Em primeiro lugar, é preciso ter amor para dar. Deve existir de fato a vontade de ter um animal, e nós do Clube dos Vira-Latas não temos preguiça para ensinar a alguém como é gostoso receber o afeto de um bicho. Em seguida, o adotante deve proporcionar segurança – ter condições de alimentar o pet e levá-lo ao veterinário. Estou falando sobre disponibilidade, e não dinheiro. Por fim, toda a família deve estar de acordo com a decisão.»

Para a presidente da ONG, a pandemia fez com que as pessoas ficassem mais sozinhas e infelizes, o que despertou o desejo de ter um animal de estimação. «Este momento abriu nossos olhos e nos mostrou novos conceitos de vida, novas prioridades. Pessoas que antes não tinham tempo para cuidar e passear com seus pets hoje têm. Eles se tornaram membros da família.»

Razão acima da emoção

Não é difícil se encantar por um cachorro, um gato ou qualquer outro animal doméstico. O brasileiro, aliás, tem o coração mole quando o assunto é esse. Prova disso são os números crescentes do setor. Em 2021, segundo o Euromonitor International, o País deve subir um degrau e se consolidar como sexto maior mercado do mundo. Hoje já somos o segundo no segmento de alimentos para cães e o terceiro de alimentos para pets.

No entanto, não se trata apenas de sentimento. Na hora de adotar é importante tomar uma decisão consciente e bastante racional, como explica o veterinário Alexandre Gurgel. «É preciso ter em mente que, se o animal for adotado enquanto ainda é filhote, viverá cerca de 15 anos. Por isso, o tutor deve ter condições de mantê-lo.»

Assim como Claudia, Gurgel atenta para o fato de que, ao mesmo tempo que a adoção aumentou na pandemia, o abandono seguiu ritmo acelerado e o pior: ainda pode subir mais. «Muita gente entrou em home office ou ficou desempregado e adotou. Quando a rotina voltar ao normal, há o risco desses animais serem jogados na rua, principalmente os sem raça definida», alerta.

Por isso, é importante refletir com cuidado e pensar no futuro. Se a conclusão ainda for a adoção, é importante pesquisar ONGs ou protetores sérios, que cuidem bem dos animais. «Há muita oferta no Facebook e no Instagram, mas tome cuidado, pois nem todas as páginas são confiáveis. Posso dizer que 90% dos veterinários conhecem boas ONGs e protetores. Pergunte a um profissional de sua confiança e ele poderá te indicar pessoas que executam um bom trabalho.»

O veterinário destaca que os ganhos da adoção responsável são imensos. «Cães e gatos são companheiros e sempre vão oferecer amor incondicional, carinho e alento. Na pandemia, os pets acabaram sendo uma distração, um ser para cuidar e com quem se ocupar ao invés de manter o pensamento fixo na doença», finaliza.

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