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Desculpas populares

A imprensa esportiva brasileira passou, nos últimos anos, a ficar mais atenta à separação – muitas vezes necessária – de resultado e desempenho. Nisso, houve uma evolução. Por outro lado, tem sido comum associar, necessária e simploriamente, um maior número de finalizações e uma vantagem na posse de bola à qualidade, ao merecimento. Sim: normalmente estes indicativos se mostram representativos. Mas nem sempre. Da mesma forma que o futebol é banhado por acasos, nuances diversas que frequentemente afastam o placar da performance advinda na prática, as estatísticas vira e mexe enganam. Entender bem o jogo inclui “senti-lo”. Não com a paixão condicionando os julgamentos. Me refiro à sensibilidade para apreender todos os detalhes que vão compondo, construindo a verdade das partidas – vários deles escapam ao “scout” final. Justamente por isso, por acreditar que uma imersão mais integral, de corpo e alma, no jogo, costuma ser útil para uma análise apropriada, tenho certa resistência ao procedimento de assistir a várias partidas simultaneamente. Às vezes é necessário e não digo que impeça obrigatoriamente a realização de corretas avaliações. Reside ainda, entretanto, a sensação de que, ao tentar ver todas, há um grande risco de não se ver nenhuma…

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Outra falsa máxima que impera no futebol é a de vincular peremptoriamente a grande atuação de um goleiro a uma boa jornada do time que o atacou. Este erro proliferou-se nos comentários acerca da derrota do Galo para o Bahia. Douglas, o arqueiro tricolor, foi um dos melhores em campo. Nem por isso, automaticamente, dá para dizer que o Atlético convenceu. Se uma equipe adota uma postura mais reativa, por estratégia pura e simples ou por reconhecer as próprias limitações, é provável que a outra, até por uma espécie de osmose, ataque um pouco mais; se a superioridade no quesito criativo será suficiente para se dizer que houve um desempenho satisfatório do conjunto que agrediu, uma série de fatores pode contribuir – e a linha entre o “poderia ter empatado pelo que o outro não fez”, e o “convenceu, foi injustiçado” é invariavelmente bastante tênue.      

Saindo do campo de jogo e entrando numa seara mais macro, de planejamento, chama atenção como anda se confundindo no Brasil priorização com abdicação do outro. Com pouca ambição. Com o excesso de zelo que recai no risco desnecessário. Defender a primazia de uma competição não cabe como discurso generalista, unilateral de que, na outra, consequentemente, será correto não entrar com o que você tem de melhor. Sofismas, “lógicas” instrumentais, engessadas em excesso, e repletas de deslizes nas proposições que as formam são onipresentes na construção do senso comum no futebol. Assim como o vício do pensar binário: que jogar sempre quarta e domingo é inviável, e o calendário brasileiro é horrível, ninguém tem dúvida; mas daí a chegarmos na era do “nunca se pode jogar terça e sábado” vai uma distância que só nossa obsessão por extremos, “verdades absolutas” consegue percorrer.

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