Durante a Copa do Mundo de 2014, Mauro Cezar Pereira – com inteligência, ótimo senso crítico, arguto poder de observação – promoveu discussões interessantíssimas sobre um fenômeno que advinha nos bastidores da imprensa: naquela competição, nos ambientes de mídia dos estádios, comum era notar os jornalistas – de toda parte – se comportarem sem o menor decoro; despidos da mais ínfima preocupação com a liturgia do cargo.
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O uso de camisas de seleções em ambientes de trabalho, por exemplo, era uma das facetas deste problema. Gritos, gestos, discussões acaloradas e sem qualquer nível intelectual; perguntas abaixo da crítica nas coletivas, comemorações desproporcionais, tudo isso, vira e mexe, aparecia.
Em coberturas nacionais tenho me deparado frequentemente com situações análogas. Invariavelmente, ao ver, sei lá, um comentarista travestido de geraldino – ou seria o contrário? – me recordo das reflexões feitas por Mauro. Nesta versão tupiniquim da questão aqui abordada, contudo, venho notando uma faceta peculiar: em inúmeras ocasiões, essa postura, digamos, inadequada, é veiculada propositalmente pelo comunicador em suas redes sociais, com o intuito de cativar pelo populismo.
E o público, em grande medida, cai como um patinho! Pior: ao ver alguém com semblante sereno, alguém que adere a uma espécie de código até tácito de postura jornalística durante o seu próprio exercício da profissão, xinga esse sujeito interpretando surrealmente que ele se mostra “frio” demais – logo, não torceria para o time que está ganhando ali no jogo que surge como pano de fundo, e sim para o rival desta equipe. Abram alas para os “fiscais de emoção”.
Já falei em outras oportunidades: quando a imprensa “puxa para um lado”, normalmente, não é por clubismo. O cara usualmente tem um time do coração. Mas, em geral, amor por clube nenhum supera, no âmago humano, o amor por si mesmo. A vaidade. Em função disso, com a intenção de ficar bem com a galera, ser elogiado, e com isso crescer, a parcialidade, se aparece, quando surge, quase sempre tem como verdadeiro motor o populismo. Cair na graça das massas. Fazer uma média aqui, outra acolá. O descontrole emocional ocasionado pela paixão clubística não supera habitualmente o decoro, a preocupação que há consigo mesmo.
Como diria Descartes, no filtro feito pela glândula pineal, o critério maior vai ser a própria sobrevivência, a tentativa de massagear o ego recebendo elogios – o que chega até a capitalizar projetos e gerar dinheiro, num segundo momento, ou seja: deitar em cima das torcidas, bajular/enganar as multidões pode ter até outros desdobramentos; bem concretos, materiais, duradouros. Chega a trazer, inclusive, votos – e num mundo onde é permitido ser político e jornalista ao mesmo tempo, é impressionante como pouca gente percebe certas intenções, determinados movimentos… O país que não sabe votar é a nação dos que não sabem julgar – inclusive o jornalismo.