Cansadas, exaustas, ansiosas e cheias de receio sobre o futuro financeiro. Os sentimentos de milhares de trabalhadoras durante a pandemia foram captados em pesquisa internacional realizada pela consultoria McKinsey em 317 empresas que empregam 12 milhões de funcionários. O relatório mostra que o novo cenário trazido pela pandemia de covid-19 foi especialmente cruel com as mulheres. Já sobrecarregadas com trabalhos domésticos, filhos e a carreira, elas tiveram de se equilibrar também com home office e escolas fechadas.
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Entrevistas realizadas com mães mostram que cerca de uma em cada quatro delas pensou em desistir ou reduzir a jornada durante o isolamento (24%). Quando a pergunta é direcionada ao pai, a porcentagem cai para 13%.
Dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) durante a pandemia mostram que muitas brasileiras optaram por deixar seus postos. De acordo com as estatísticas oficiais do órgão, é a menor taxa de participação feminina no mercado de trabalho dos últimos 30 anos. Desde abril, a taxa se mantém em 46,3%. No ano passado, ela alcançava 53,3%.

Deixar a vaga que ocupava há nove anos como auxiliar administrativa foi a opção encontrada por Elaine Cristina Borges, 34 anos, para poder dar conta dos dois filhos, de 2 e 9 anos, após o fechamento das escolas. “A pandemia mudou muito nossa rotina. Sempre trabalhei e dependia da escola. Percebi que não conseguiria voltar a trabalhar. Fica sempre o sentimento de culpa, por não estar se dedicando direito nem ao trabalho e nem à família”, conta.
A geóloga Taís Lima de Castro também teve de mudar a rotina ao perceber que não teria com quem deixar as filhas de 10 e 6 anos. Ela trocou o cargo de gerência que ocupava pela primeira vez por uma vaga de remuneração menor, mas que permitisse o home office. “Eu brinco que tem que escolher o prato que vai cair. Tem dia que não vai conseguir cuidar da casa, da escola, da roupa, de comida e ainda entregar o trabalho.”
“Tive que colocar na balança a minha carreira profissional e meu compromisso de maternidade», Thais Uma de Castro
“Você está no serviço e tem a culpa de deixar o filho o dia todo na escola. Se está em casa, a culpa é não contribuir financeiramente», Elaine Cristina Borges
‘Empresa que entende a equidade ganha diferencial’
Empresas que entendem o poder de manter o equilíbrio de gênero nas lideranças das equipes vão sair na frente. A análise é da gestora executiva do Movimento Mulher 360, Margareth Goldenberg. A associação mantém trabalho conjunto com grandes empresas para promover o aumento da participação feminina no ambiente corporativo. “Manter a mulher é um diferencial competitivo para os negócios, não só questão de justiça social”, analisa.
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Margareth afirma que a pandemia teve impacto maior em vagas de trabalho no setor de serviços, onde a mulher tem grande participação. A característica impacta na redução da participação feminina na força de trabalho. Mas ela também vê a questão dos reflexos do fechamento de creches e escolas. “O home office com o homeschooling é praticamente inviável. Há pouco apoio da família. Muitas ficam sozinhas com crianças de até 10 anos.”
“As empresas que não colocaram os colaboradores em primeiro lugar durante a crise vão sair atrás», Margareth Goldenberg
Para manter as mulheres em seus cargos, ela afirma ser necessário um pacote de ações, que inclui também a análise individual de cada caso.
Além da redefinição de critérios de prazos e desempenho para manter a saúde mental de toda equipe no home office, ela cita medidas para incentivar maior participação masculina dentro do lar e da família, com promoção de discussões e aumento da licença paternidade. “A gente costuma dizer que precisa de um combo de iniciativas para a retenção das mulheres, principalmente após a licença maternidade. Estudo da Fundação Getulio Vargas mostrou que é caro perder a profissional que volta da licença. Estamos engravidando tarde, então essa mulher tem entre 30, 35 anos, está há seis anos na empresa, com acúmulo de prática e potencial para liderar. Se ela sai, fica a lacuna.”