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Para Mourão, diálogos vazados ‘não têm nada de antiético’; leia entrevista

O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, defendeu o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, em entrevista ao jornalista Oziris Marins, da Rádio Bandeirantes, na sexta-feira. O general afirmou que, embora o hackeamento de conversas tenho sido criminoso, não revelou nada de “antiético” e que não há motivos para qualquer investigação do caso. “Você vai dar legalidade a um crime e vai passar o que para a sociedade? Que podemos invadir todos os celulares sem autorização judicial e sair condenando quem quisermos?”, questionou. Confira a entrevista:

O ministro Paulo Guedes esteve em Novo Hamburgo e falou sobre a reconstrução do pacto federativo. O senhor acredita que pode ser refeito ainda neste governo?
O que o nosso governo pode fazer é assentar as bases para que a gente mude esse pacto que temos hoje, quando a União fica com a maior parte dos recursos e estados e municípios com a menor parte, o que obriga prefeitos e governadores a fazerem aquelas peregrinações por Brasília em busca de recursos. Isso está muito atrelado à reforma tributária, de modo que a gente possa reorganizar esse manicômio tributário que nós temos e, partir daí, de forma paulatina, ir colocando os recursos de forma mais preponderante em estados e municípios, com as devidas obrigações.

O governo gesta uma reforma tributária e há outra em andamento na Câmara, que unifica cinco impostos. Mas também há o pacote anticrime. O que será prioridade neste semestre?
Há condições destas duas medidas caminharem lado a lado. O anticrime foi apresentado junto com a reforma da Previdência, atende a anseios da população e busca solucionar parte dessa nossa situação difícil da segurança pública. O ponto importante é que já se entendeu que a reforma tributária é necessária e temos que partir para esta discussão.

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O Supremo devolveu as atribuições da Funai para o Ministério da Justiça. O governo vai tentar reverter isso ou vai ficar assim?
O presidente Bolsonaro tinha a visão de que essa questão da demarcação de terras indígenas deveria estar centralizada no Ministério da Agricultura. Uma vez que houve essa decisão do Supremo, compete ao Executivo cumpri-la. Acredito que o presidente não fará mais nenhum esforço de levar para a Agricultura.

A morte do indígena no Amapá com o avanço do garimpo foi manchete internacional. O que pode ser feito para se garantir segurança nestas regiões?
Em primeiro lugar, temos que esclarecer esta situação do assassinato do líder indígena na aldeia Waiãpi. Está sendo feita a exumação do cadáver porque as primeiras investigações não indicaram que tivesse havido algum tipo de invasão da área por garimpeiros ou qualquer outros grupos de homens brancos. Isso me recorda aquele episódio do massacre na região dos ianomâmis, em 1993. O ministro da Justiça era o Maurício Corrêa, que chegou a ir até lá, em território venezuelano e não houve nada. Os índios tinham saído dali, eram nômades e foram para outra região [segundo o G1, 12 índios foram mortos por garimpeiros que invadiram área dos indígenas em Roraima; eles foram condenados em 2006, sendo o massacre considerado um genocídio]. Faz parte do trabalho do governo esclarecer essa situação. Essas regiões mais afastadas precisam ter uma fiscalização constante para impedir que não índios ingressem de forma irregular nestas áreas indígenas.

O senhor acha que precisa criar novos batalhões de fronteira?
Neste momento, o governo não tem pernas para expandir nossas Forças Armadas, muito menos para transferir unidades de outros lugares do Brasil para a região Norte. O que nós temos é que aumentar a fiscalização com meios mais modernos e tecnologias, como satélites e aviões de reconhecimento.

O governo chegou a falar em liberar o garimpo pelos próprios índios. Isso seria benéfico?
Existem duas visões sobre este tema. Há lideranças indígenas que pedem pelo amor de Deus para o governo autorizar a exploração de riquezas minerais em suas terras. Tem outros que não. Isso é uma questão de legislação, precisa ser regulado e, por isso, ser discutido no Congresso.

O vazamento das gravações pelo Intercept tornam insustentável a permanência de Sergio Moro na Justiça?
Acredito que não. O ministro Moro e outras pessoas que foram submetidas a este hackeamento foram vítimas de um crime. A partir do momento que houve um crime, morre o assunto. Sobre as conversas, na minha opinião, ali não tem nada que seja antiético ou [que não seja] do trato normal de juiz, procurador ou delegado que estejam envolvidos na investigação de uma organização criminosa.

O senhor acha que não houve rompimento da paridade de armas?
Em absoluto. A discussão toda acaba se centrando na questão do ex-presidente Lula. Se o processo conduzido pelo ministro Moro fosse irregular, o TRF4 não o teria condenado. Para mim, esta discussão morre.

Se surgir indício de algum crime grave nas gravações, o senhor acha que deve haver investigação?
Não, porque é ilegal. Você vai dar legalidade a um crime e vai passar o que para a sociedade? Que podemos invadir todos os celulares sem autorização judicial e sair condenando quem quisermos? Daí o Estado de Direito morre dentro deste país.

Há algum plano progressivo para combater o desemprego no país e recuperar os postos de emprego?
Neste primeiro semestre, já tivemos uma recuperação do emprego com carteira assinada. É um soluço, um movimento pequeno ainda, mas o Banco Central nos trouxe indicadores de que a construção civil pode retomar, a indústria de transformação também está entrando em um processo de retomada. Por outro lado, é importante que se entenda que estamos entrando numa nova era, da economia do conhecimento, e muitos postos de trabalho vão mudar neste processo. A indústria, que sempre foi uma grande empregadora, vai contratar menos, e as pessoas vão migrar para o setor de serviços, que será o grande empregador do futuro.

Como o governo pode ajudar os estados na questão dos presídios, a exemplo deste massacre recente entre detentos no Pará?
A situação das narcoquadrilhas é um caso extremo, é uma verdadeira guerra entre facções. O governo federal ajuda os estados oferecendo vagas nos presídios federais para estas lideranças, que são as que conduzem estes massacres, para isolá-los. Isso já aconteceu no Ceará no início do ano e agora também no Pará. Mas os estados precisam apresentar projetos para o Fundo Penitenciário, com R$ 1,6 bilhão, que é uma verba destinada a construir presídios.

A partir da sua experiência internacional, o senhor avalia que há solução para a crise da Venezuela?
A solução passa pela neutralização dos atores externos, principalmente a questão de Cuba. Hoje, 20 mil cubanos estão na Venezuela e controlam o sistema de inteligência e as milícias. Ele foram chegando pouco a pouco e ainda incutem um certo temor em segmentos das Forças Armadas que são contrários à política do Maduro. A partir do momento em que houver esta neutralização, os venezuelanos poderão conversar e chamar nova eleição. Não se pode ignorar a existência do chavismo. Defendo a mediação, uma intervenção a gente nunca sabe como termina.

O que o sr. acha da indicação de Eduardo Bolsonaro para o cargo de embaixador nos EUA?
O deputado Bolsonaro reúne as condições técnicas para ocupar este lugar, de acordo com a nossa legislação. O presidente acha que alguém da sua família, tendo uma relação mais próxima com o presidente Trump, favoreceria os negócios com os EUA. Portanto, concordo com o presidente.

O Senado vai avaliar a reforma da Previdência nas próximas semanas. O sr. acha que há possibilidade de ainda incluir estados e municípios?
Acho difícil que se incluam estados e municípios agora. Acredito que, depois de aprovada a proposta que está em curso, ela vai servir de baliza para que estados como São Paulo, Rio de Janeiro e o nosso Rio Grande do Sul produzam uma nova legislação dentro de suas Assembleias.

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