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Após quatro anos, pais de vítimas da boate Kiss aguardam julgamento

Olhos cobertos de lágrimas, mãos trêmulas e falas indignadas – entrecortadas para respirar e restabelecer a calma. Tal definição é uma constante nos depoimentos de pais e mães de vítimas do incêndio da boate Kiss, às vésperas do aniversário de quatro anos da tragédia que matou 242 jovens em Santa Maria. “Para nós, o sentimento é de que tudo aconteceu há poucos dias”, define Flávio José da Silva, que perdeu sua filha, Andrielle – que na época tinha apenas 22 anos. Inconformados com a demora na resolução do caso (que sequer foi julgado), com a impunidade de gestores públicos santa-marienses e com a postura do Ministério Público (que está processando, por calúnia e difamação, três pais e uma mãe de vítimas), Flávio e outros parentes protocolaram, na quarta-feira (25), uma petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), denunciando a omissão do governo brasileiro no caso.

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Eles contaram com o auxílio da advogada Tâmara Biolo Soares, coordenadora do Instituto Juntos. Ela assinou o documento ao lado de representantes da AVTSM (Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria), do IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil), do Senge-RS (Sindicato dos Engenheiros), entre outros.

Agora, o processo será analisado por uma comissão da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O governo brasileiro terá um prazo de três meses para se manifestar. Em seguida, a comissão propõe uma solução amistosa. Se a proposta amigável não for aceita pelo governo, será determinada uma sentença. Caso o Estado não acate o que foi sentenciado, o processo será julgado na Corte.

A Lei Maria da Penha – criada após recomendação da OEA – é um exemplo do poder de intervenção da organização. “O objetivo é trazer justiça. As vidas destes jovens foram criminosamente ceifadas pela omissão da prefeitura, dos bombeiros e do Ministério Público, que sabiam das irregularidades da boate e não impediram seu funcionamento”, relata Tâmara. A expectativa é de que a Corte sentencie o caso em até seis anos.

A cerimônia, realizada na sede da IAB, contou com a presença de um casal que sobreviveu à tragédia. Francisco Pinto e Aline Henriques Maia vivem, até hoje, uma rotina de tratamentos médicos e sequelas do incêndio. “Nós temos uma filha e estamos tentando superar esse trauma. Mas é preciso que se faça justiça com todos os responsáveis. Eu não consigo mensurar a dor sentida pelos pais que perderam seus filhos no incêndio”, diz Francisco.

Indignação com o MP

A petição também pede o arquivamento dos processos abertos contra três pais e uma mãe. Eles foram processados por calúnia e difamação pelos promotores do caso, após criticarem o MP por não promover ações contra gestores públicos da época – como o ex-prefeito de Santa Maria, e atual Secretário de Segurança do Estado, Cezar Schirmer.

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O processo aos pais dá margem à uma situação inusitada: é possível que os pais das vítimas sejam julgados – e condenados – antes dos réus do processo da boate Kiss.

Em nota, o Ministério Público afirmou que “todas as responsabilidades foram apuradas” e que “é irresponsável instigar falsas expectativas baseadas em maliciosas hipóteses jurídicas”. 

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