
Se você perguntar a um ciclista, como o que assina esta reportagem, o que ele pensa sobre a criação de ciclovias em São Paulo, provavelmente ele irá elogiar a iniciativa. Se o questionamento for dirigido a um motorista, talvez ele critique, muito embora a separação de bicicletas e carros no caótico trânsito da capital seja algo que o beneficie também. Agora, mesmo um ciclista que seja fervoroso em apoiar as ciclovias há de reconhecer que a manutenção destes espaços ainda precisa melhorar. E muito.
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O Metro Jornal percorreu trechos de algumas das faixas exclusivas para bicicletas da cidade num total de 15,5 km de extensão. Segundo a prefeitura, atualmente a cidade tem 379,3 km de ciclovias, 282,7 km criadas na gestão de Fernando Haddad (PT). Há promessa de que outros 117,3 km sejam entregues neste ano. As ciclovias percorridas pela reportagem estão em bairros como Higienópolis, Pacaembu, Jardins e Vila Mariana, alguns dos pontos com os metros quadrados mais caros da cidade. Mas o ciclista que decidir encará-las deve redobrar a atenção e tomar cuidado com os obstáculos pelo caminho. São árvores cujos galhos não conhecem a poda há tempos, buracos de todos os tamanhos e para todos os gostos e irregularidades no asfalto capazes de fazer um passeio virar algo próximo de um esporte radical.
A rua França Pinto, na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, tem um trecho em descida, no caminho para o parque Ibirapuera, onde falta tinta, mas sobram irregularidades para os ciclistas que seguem pelo movimentado local.
E, se o desafio já é grande para alguém experiente, para quem não tem tanta intimidade com pedais e guidão o risco é maior. A gerente de e-commerce Lilian Frazão, 45 anos, conheceu este perigo no dia 31 de janeiro. Com amigos, ela seguia pela ciclovia da av. Pacaembu, quando a roda da bike cravou num buraco, fruto do descaso. Ela voou e ao aterrissar quebrou o maxilar e um braço. O acidente de Lilian teve repercussão (leia ao lado).
Como ilustram as fotos que preenchem estas páginas, o ocorrido com Lilian pode se repetir facilmente. Uma situação longe da ideal. Segundo Julio Cesar de Freitas, coordenador do curso de Pós-graduação em Design de Mobilidade Urbana do Centro Universitário Senac, as ciclovias devem oferecer segurança aos ciclistas. E são esses, na opinião do especialista, que devem estar na linha de frente para que a manutenção seja feita. “O ciclista é o fiscal. Ninguém tem mais interesse na manutenção das ciclovias, do que ele. A ‘perfeita manutenção’ é uma utopia. Mas, com a mudança de cultura, mais a fiscalização dos usuários e o apoio permanente da imprensa, teremos uma manutenção digna e constante”, avalia Freitas.
Fraturas, dor e nenhum telefonema
No meio da ciclovia tinha um buraco. Tinha um buraco no meio da ciclovia. E isto não tem nada de poético. Para a ciclista Lilian Frazão, 45 anos, significou fraturas no rosto e no braço esquerdo, uma cirurgia para colocar parafusos e uma placa no rosto, além de fortes dores até hoje.
“Sou canhota e estou afastada do trabalho. Tenho feito fisioterapia e por 20 dias me alimentei só de líquidos e não podia falar”, diz Lilian, que já viajou para pedalar na França, Itália e Alemanha e tem muitas trilhas brasileiras no currículo. Mas apesar do sofrimento atual, ela apoia as ciclovias.
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“Sou totalmente a favor. As bicicletas vieram para ficar. Mas é preciso responsabilidade de quem as faz. Não pode ser só uma pintura em cima de armadilhas. Temos que cobrar tal responsabilidade, pois elas são feitas com o dinheiro de nossos impostos”, resume.
Apesar da grande repercussão, ninguém da prefeitura entrou em contato com Lilian. Questionada, a administração se limitou a dizer, via assessoria de imprensa, que lamentava o acidente. Mas não respondeu porque não procurou a vítima da queda na ciclovia, uma das maiores bandeiras da gestão Haddad.
Também respondeu que aquela ciclovia foi feita pela construtora Think, como contrapartida por quatro torres erguidas na Barra Funda, zona oeste de SP. O Metro Jornal perguntou à Think se foi feito algum contato com Lilian. Assim como a prefeitura, a área de marketing afirmou lamentar o ocorrido, mas também não explicou por que não houve contato.
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