A situação é de calamidade: o maior reservatório do Rio de Janeiro entrou no volume morto; Minas Gerais estuda racionamento e fala em economia urgente de 30% do consumo; e em São Paulo a previsão é de que a água do maior reservatório acabe em até quatro meses.
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«Há um problema grave de infraestrutura, que nos deixou muito dependentes do clima», aponta o engenheiro especialista em recursos hídricos e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista), Jefferson Nascimento de Oliveira.
O especialista afirma que se o Sistema Cantareira secar, a única saída para que a população não seja desabastecida é a interligação dos reservatórios. «Existem quatro sistemas e eles precisam estar rigorosamente interligados. E isso precisa ser feito muito rápido, milhões de pessoas correm o risco de ficar sem água», alerta.
Caso contrário, só será possível captar a água que entrar no sistema – o que dependeria do clima e iria variar diariamente.
A Sabesp já transferiu parte do abastecimento do Cantareira. No meio da crise, cerca de três milhões de usuários que eram atendidos pelo sistema passaram a ser abastecidos pelo Guarapiranga. E segundo a companhia, outras medidas semelhantes só poderiam ser feitas a longo prazo.
Racionamento
Para o especialista em recursos hídricos – paralelo a obras de infraestrutura – é preciso endurecer as medidas de contingência. Ele acredita que o racionamento já deveria ter sido implantado em São Paulo (com a definição de horários e locais de corte de água).
«Não é um processo fácil, mas tem que ser feito», diz. Segundo ele, a dificuldade existe principalmente porque precisa haver um estudo que aponte com precisão quais os locais não podem ficar sem água (hospitais e clínicas) e como será feito o desligamento.
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Volume morto
Segundo a Sabesp, ainda há a terceira cota do volume morto do Cantareira (que estaria disponível na represa Atibainha). Seria o último recurso: 41 bilhões de litros de água.
O especialista alerta, no entanto, que os consumidores não podem esperar que a terceira cota dure o mesmo tempo que a primeira e a segunda. «É como o corpo humano, tem a pele, a epiderme, derme… a terceira cota seria como usar o osso», compara. «O tempo de vida seria muito curto».
Além disso, a Sabesp precisa de autorização da ANA (Agência Nacional de Águas) para a captação da água.
Exemplo de fora
Países que já convivem com a falta de água têm apostado no uso da tecnologia e no reaproveitamento: Israel é um dos que mais investe na dessalinização. Já os Estados Unidos e alguns países da Europa têm apostado na água de reuso.
Para o professor da Unesp é preciso que essa crise provoque «uma mudança de paradigma» também aqui no Brasil e cita o reaproveitamento do esgoto (água de reuso) como uma alternativa viável.
Já há estações de tratamento do tipo em Campinas e São Paulo está investindo em duas, o que renderia a produção de 3 mil litros de água por segundo.
Para o professor aposentado pela Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), especialista em hidráulica e saneamento, Julio Cerqueira Neto, a medida é mais viável do que a dessalinização.
O tratamento da água do mar para o consumo é muito caro. Além disso, as praias do Brasil sofrem com a poluição e por isso seria necessário instalar tubulação muito longe da costa, o que aumentaria ainda mais os custos. Há também preocupação com o descarte dos sais da água, que seriam retirados durante o tratamento.