Na pequena Delegacia de Defesa Institucional do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, agentes da Polícia Federal desenvolveram uma tecnologia inédita na América Latina. Eles conseguiram, por iniciativa própria, desenvolver um método de rastreamento da deep web — conhecida como a internet “oculta” por permitir que computadores troquem mensagens de forma anônima. O trabalho resultou na Operação Darknet, deflagrada há poucos meses, que envolveu 500 agentes e prendeu 57 acusados de pedofilia no país inteiro, em cooperação com 18 Estados.
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Os criminosos usavam a rede para enviar fotos e material pornográfico envolvendo crianças. Na internet visível, acessada diariamente pelas pessoas, é possível localizar usuários pelo ponto de acesso, conhecido como IP. Ao adentrar a deep web — que é cerca de 60 vezes maior –, o endereço é mascarado, o que impede a localização. Por isso mesmo, a internet profunda ficou conhecida por permitir atividades criminosas e abrigar bizarrices que, na internet normal, seriam rapidamente reprimidas pela polícia.
Até então, só o FBI e a Interpol, respectivamente, haviam conseguido investigar pessoas a partir da deep web. Chefe da equipe que criou a tecnologia no Brasil, o delegado da PF Daniel Madruga não esconde o orgulho de seu time. Foi um ano de investigações e, agora, o método está à disposição de todas as unidades da PF.
Por motivos de segurança, o delegado Madruga não revela mais detalhes sobre esse mecanismo de rastreamento, mas adianta que outras operações envolvendo a deep web estão em andamento. “Este trabalho pioneiro já está à disposição da PF, que agora tem capacidade de investigar na deep web, sejam quais forem os crimes”, salienta.
Policiais ou acadêmicos?
Em casos como esses, quem ajuda na investigação são profissionais formados em ciências da computação e áreas afins. É do interesse não só da PF, como também da Polícia Civil, que os agentes se especializem ainda mais. Na Universidade de Brasília (UnB), existe até uma linha de mestrado em informática forense e segurança da informação, que conta com 30 oficiais matriculados.
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Coordenador acadêmico do curso, o professor Rafael de Sousa explica que a deep web não é irrastreável. “A internet, definitivamente, não é invisível. Se algo é eletrônico, emite ondas eletromagnéticas e pode ser rastreado”, atesta.
Uma das formas de se investigar a rede secreta, segundo o professor, é estudando o tráfego da internet. Embora com IP escondido, quem troca mensagens pela deep web ainda produz pacotes (como são chamadas as unidades de dados) visíveis. Um dos indícios de que existiria uma atividade ilícita seria a troca de pacotes entre um pequeno grupo de usuários sem localização de IP definida.
Tráfego de dados constante entre computadores ocultos é um sinal mais do que suspeito. Quem monitora esse trânsito consegue, também, verificar o formato das mensagens partilhadas. Geralmente, grupos de pedofilia na deep web, por exemplo, trocam fotos, identificadas pelo formato, que pode ser jpg, jpeg, entre outros.
Outra forma de capturar criminosos é se infiltrando, como um espião virtual. “Muitas vezes, o oficial se torna um usuário para interagir como um deles, tentar descobrir informações e capturar provas”, explica o professor.