A gestação é um momento mágico na vida da mulher, mas, ao mesmo tempo em que há muita felicidade por gerar uma nova vida, muitos medos e expectativas surgem ao longo da gravidez. E um dos temas que sempre geram discussões é a escolha do parto, seja ele normal, cesárea ou humanizado.
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Especialistas ouvidos pelo Metro World News destacam que, sem dúvidas, o parto normal é sempre o mais indicado, pois nele são reduzidos os riscos para mãe e bebê. No entanto, há casos em que ele não é possível e a mulher tem que ser submetida a uma cesárea.
Em São Paulo, em agosto de 2019, o governo sancionou um projeto de lei de autoria da deputada estadual Janaina Paschoal (PSL), que garantia a gestantes atendidas pela rede pública de saúde a possibilidade de optar pelo parto cesariano a partir da 39ª semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal.
Após a sanção, a Lei Estadual nº 17.137/2019 gerou muitas discussões, já que as entidades de saúde temiam um aumento do número de cesáreas desnecessárias, que são aquelas agendadas, sem que haja uma questão médica que exija o procedimento.
Em julho de 2020, no entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) declarou que a medida era inconstitucional, e, portanto, inválida. O órgão entendeu que a matéria deve ser tratada por meio de lei federal, e não estadual, em cumprimento às regras previstas na Constituição Federal sobre as competências legislativas da União, dos Estados e dos Municípios.
Além disso, o Desembargador Alex Zilenovski, relator dessa ação, pontuou na época que já existe legislação federal suficiente sobre a Lei Federal nº 8.069/1990. Ele ressaltou, ainda, que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que “a gestante tem direito a acompanhamento saudável durante toda a gestação e a um parto natural cuidadoso, estabelecendo-se a aplicação de cesariana e outras intervenções cirúrgicas por motivos médicos”.
Para o ginecologista e obstreta Caio Parente Barbosa, que também é professor da disciplina de Saúde Sexual e Reprodutiva da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), além das questões previstas em leis, o que deve sempre ser priorizado é o bem-estar da paciente e o respeito às suas escolhas.
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«O que toda mulher merece é uma assistência ao parto decente. Isso quer dizer ter todos os recursos que a medicina oferece para que ela não sofra, independentemente de ser na rede pública ou privada. Que ela possa optar pela analgesia no momento de dor e que, se for o desejo dela, possa optar por uma cesárea. O grande problema é que a maior parte das mulheres opta pela cesárea pelo medo do tipo de assistência que ela vai ter. Como elas não sabem que ficarão horas sofrendo com dor, o que é muito relatado na rede pública, muitas têm medo e ficam nessa ansiedade pela cesárea», destacou.
Segundo o médico, o parto normal é sempre o mais indicado, mas, quando há algum risco para a paciente ou bebê, deve ser respeitada a orientação do médico. «Quando há questões médicas envolvidas, a cesariana pode sim ser a mais indicada e ela salva vidas. Se fala muito contra o procedimento, pois do ponto de vista da medicina, antigamente, as mães tinham muitos filhos, seis, sete, oito, então, não era viável fazer tantas cesáreas assim. Mas hoje em dia, quando a maioria tem um ou dois filhos, não é fazer duas cesáreas que vai gerar mais riscos. Mas também não se deve fazer apenas por conveniência, sem a devida necessidade», alerta Barbosa.

Parto normal x cesárea
O ginecologista ressaltou que o ideal é que toda gestante entre em trabalho de parto e que, só aí, de acordo com a avaliação feita a partir daquele momento, o médico indique a forma ideal para o parto e comunique a mãe para que ela fique ciente do que está acontecendo.
«Muitas vezes a paciente idealiza um parto normal, mas acaba não tendo dilatação, ou o bebê está sentado; ou há desproporção cefalopélvica, que é quando a cabeça do bebê é maior do que a bacia da mulher; há casos em que a paciente apresenta placenta prévia, ou seja, existem algumas questões que inviabilizam o parto normal. Aí sim há indicação de cesárea. Agora, já escolher a cesariana apenas por medo de sentir dor, por exemplo, não é a melhor escolha, já que a recuperação no pós-parto tende a ser muito mais dolorida», explica.
No entanto, quando é o desejo da mulher optar pela cesárea, Barbosa diz que alguns critérios também devem ser adotados, não apenas questões de conveniência. «Se eu faço uma cesárea com 39 semanas, o riscos de complicação são mínimos. Mas eu, particularmente, acho que todas as pacientes deveriam entrar e trabalho de parto. Isso evitaria riscos como a síndrome de adaptação respiratória no bebê, que pode ocorrer com mais frequência em uma cesárea que foi planejada, mas que feita antes da mulher estar em trabalho de parto. Por isso, o ideal é que, mesmo que a paciente queira uma cesárea, ela espere a bolsa estourar, começarem as contrações e tudo mais. Isso diminui os riscos. Marcar uma cesárea apenas por conveniência não é o ideal», reforçou o médico.
Parto humanizado
Hoje em dia se ouve muito falar sobre parto humanizado, mas nem todo mundo faz ideia do que caracteriza esse tipo de assistência. Segundo a doula Tatiane Okazaki, que também atua como doula de pós-parto e é consultora em amamentação há mais de 4 anos, em São Paulo, existem três fatores principais:
«O parto humanizado vem da humanização da assistência, que é baseada em três pilares: autonomia da mulher, já que ela é informada sobre os riscos, benefícios, cada passo do processo para que ela tome decisões conscientes; o segundo é a medicina baseada em evidências, já que o procedimento adotado não deve ser baseado em achismo ou experiências anteriores dos médicos e, sim, em estudos clínicos; e, por fim, a questão da multidisciplinaridade, que é quando existem várias especialidades trabalhando juntas para um parto positivo», explicou.
Segundo a doula, o parto humanizado é aquele normal, em que a mulher consegue ter o filho naturalmente, sem o uso de recursos como anestesia, por exemplo. «Nesses casos há uma equipe formada por médico, enfermeiras obstétricas, as doulas, e todo o ambiente gira em torno das escolhas da mulher. Da forma que ela quer ficar até o parto e, principalmente, do contato que terá com o bebê logo após o nascimento», explicou.
Já no caso das cesáreas, Tatiane explica que não há procedimento que possa ser chamado de humanizado. «Muitos médicos vendem essa ideia de cesárea humanizada, mas, quando partimos do preceito que o humanizado parte da escolha da mulher, não tem como a mulher fazer o próprio corte na barriga. O que existe é a cesárea respeitosa, que é aquela realizada quando necessário, não é agendada sem necessidade, que não é sem indicação, que respeita os processos, deixando a mulher ter apoio de seu acompanhante, da doula, onde a atenção na sala de parto é voltada para mãe e bebê, sem conversas paralelas, e colocando o recém-nascido com a mãe logo após o parto», destacou.
Tatiane diz que, em casos em que há riscos e a cesárea é indicada, o papel da doula é explicar para a mulher a necessidade do procedimento e deixar ela ciente de tudo o que será feito, com muita tranquilidade.
Rede Doulas
E foi pensando em oferecer um atendimento humanizado a mais mulheres que Tatiane se uniu a outras profissionais e criaram a Rede Doulas, que presta serviços de doulagem. Ela explica que são oferecidos pacotes para acompanhamento das gestantes antes, durante e pós-parto, mas também há serviços avulsos.
«Nosso trabalho consiste em acompanhar essa gestante e seu acompanhante para prestar todo o apoio. Infelizmente, por causa da pandemia de covid-19, temos enfrentado resistência de alguns hospitais para liberar a nossa presença durante os partos. De toda forma, seguimos prestando as consultorias, até mesmo online, e dando todo o suporte que a mulher e a família precisam para garantir a humanização», explicou.
Segundo a doula, o ideal é que a gestante receba acompanhamento logo no início, para que elas criem vínculos e que todos os procedimentos do parto possam ser devidamente explicados. Além disso, a pessoa que vai acompanhar a mulher também deve participar, já que é ela quem vai representar a grávida naquele momento tão importante.
«Quanto antes começarmos o trabalho melhor, pois a mãe vai receber informações para que fique tranquila, saiba o que está acontecendo com o corpo durante o parto, e fique mais calma para lidar com dores, sangue, contrações. Quando a gente tem um medo, ele vem daquilo que você não conhece. E parto tem a ver com hormônio, se você tem esse bloqueio do medo, impacta diretamente na produção dos hormônios e aí fica mais difícil. Hoje, infelizmente, a gente ainda vive um cenário de violência obstétrica, pois existem muitos profissionais que estão desatualizados. Quando um acompanhante tem a informação, ele pode ajudar a evitar essa violência», ressaltou.
Tatiane destacou, ainda, que toda mulher merece ter o acompanhamento de uma doula e, mesmo aquelas que não podem pagar pelo serviço, podem se informar para obter a assistência de uma doula voluntária, por exemplo.
«Na internet, hoje, tem muita informação sobre esse assunto. Há blogs, páginas no Instagram, muitos lugares que disponibilizam informações confiáveis sobre o parto humanizado e todos os cuidados que devem ser observados. Mas as mulheres podem e devem ir atrás de ajuda, pois existem doulas que fazem trabalhos voluntários, principalmente para pacientes do SUS», concluiu.