Há muitos anos uma música do cancioneiro popular, daquelas dos tempos do radinho de pilhas, tinha um refrão que dizia: “ele está de olho é na butique dela, ele está de olho é na butique dela”. Quem passou dos 40 anos lembra bem dessa música (ou se faz de sonso com receio das gozações).
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O cantor era o genial Genival Lacerda; e a letra, de inocente duplo sentido (para os padrões de hoje), ironizava a cobiça de um rapaz por uma mulher que, antes pobre e feinha, abrira a tal “butique” e prosperara, agora sendo alvo dos galanteios daquele que, na verdade, só queria o negócio dela. Sem duplo sentido. Pois a tal cobiça, em si mesma, não é tão perniciosa quanto sua mãe, a inveja.
Cobiçar todo mundo cobiça, seja determinado bem material, seja atingir um estágio espiritual de evolução, para tratarmos dos extremos. É até bom que exista a cobiça porque, dosada, ela motiva o ser humano a prosperar, lembrando que prosperidade é crescimento sustentável e, não, inchaço. Mas a tal da inveja, essa talvez seja o pior dentre todos os defeitos de nossa personalidade.
O(a) invejoso(a) não quer a mesma coisa que o outro alcançou; não deseja ter o mesmo tipo de desempenho, sucesso, consideração, respeito ou vida que sua referência conquistou: ele(a) quer SER essa pessoa e TER exatamente aquilo que essa pessoa tem, desapossando-a ou desqualificando-a para atingir seu intento. O invejoso não quer se igualar ou mesmo superar seu alvo porque, no fundo, nutre um sentimento de inferioridade que só pode ser aplacado com o fracasso do outro, e não com o sucesso próprio.
Há casos patológicos, como o de colegas que fazem de tudo para desqualificar os outros em seus ambientes de trabalho, social ou familiar, chegando ao extremo de criar fatos envolvendo o invejado ou imputar ao mesmo, sorrateiramente, palavras ou atos tendentes a formar intrigas e desavenças entre aquele e outros integrantes do círculo. O invejoso não se contenta com vencer apenas: ele quer exterminar. Aliás, os grandes ditadores sanguinários da história eram pessoas de vida medíocre antes de ascenderem ao poder. Não desejavam apenas um lugar ao sol: queriam ser o próprio sol. Não pela grandeza do astro, mas pela certeza de que só assim conseguiriam ofuscar suas deficiências.
O invejoso não se compadece da tristeza alheia, porque vê nela uma oportunidade a mais de superar seus concorrentes. Tampouco vibra com a felicidade do outro porque se sente usurpado. É alheio e costumeiramente frio, mas disfarça sua natural falta de empatia e a corrosão interna que sofre pelo destaque alheio com rompantes de falsa e exagerada generosidade: desconfie de quem chora mais do que os verdadeiramente afetados ou exulta muito mais que os próprios vitoriosos.