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Do Brasil, S.O.S. ao Brasil

Rubem-Penz“O Brasil não conhece o Brasil
O Brasil nunca foi ao Brasil”
Aldir Blanc

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Quem produz arte tem duas vidas: uma delas menor, carnal, cronológica. Definida e limitada por nossa condição humana. A outra maior, etérea, de alcance incerto e reverberante no tempo e no espaço. A morte evidencia estas duas dimensões. Impactado com certa notícia, tive uma curiosidade imensa e saí a perguntar pela rua, buscando alguém que conhecesse o artista falecido. Pelo nome, ninguém sabia. Não me conformei: fui ao jornal, recortei a foto e parti novamente:
– Conhece ele?
Um disse que nunca ouvira falar. “Deveria?”, respondeu outra. Um terceiro, negando com a cabeça, perguntou se ele era daqui. Respondi que não, aqui da cidade não, mas era brasileiro. E, depois de muitas tentativas, um senhor falou que sabia. Mas errou o palpite.
– O que houve com ele? – quis saber o palpiteiro.
– Morreu. Estou muito triste. É como se uma parte da música brasileira se perdesse… Também uma parte da minha vida.
– Então, ele era importante?! – espantou-se.
– Importante? Nossa! Poucos no país foram tão admirados. Saiu no jornal, na TV, no rádio. Não leu, viu, escutou?
– Nunca leio obituários…
Assim, quase sem repercussão na atualidade, ainda que com reverberação no futuro, um Brasil viu partir Fernando Brant.
Passaram-se alguns dias e a fatalidade voltou a visitar a música brasileira. Porém, ao invés de notas fúnebres, programações inteiras foram alteradas para dar cobertura ao fato. Repórteres deslocados para o lugar, retrospectivas, melhores momentos, piores momentos (vazamento mórbido de imagens na web). Comoção. Nossa: eu jamais suspeitara ser tão ilustre aquele desconhecido…
Assim, quase sem repercussão no futuro, ainda que com reverberação no presente, outro Brasil viu partir Cristiano Araújo.
– Que tristeza o artista que morreu, né? – comentou um comigo, na rua.
– Muito triste, mas só soube da existência dele agora – respondi constrangido.
– Em que país você vive?
– Já não sei – respondi. – Mas do exílio onde vivo, lembrei de uns versos do bom e velho Aldir Blanc.
– Versos de quem?

Rubem Penz é escritor, músico, publicitário, baterista e compositor. Autor de “Enquanto Tempo” e coordenador da oficina literária Santa Sede crônicas de botequim. Seu site é rubempenz.net

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