Não melhora a vida de ninguém dizer que foi no cumprimento da lei que o juiz abriu a porta do xadrez de segurança máxima, em Rondônia, e liberou Fu e Claudinho, sanguinários traficantes da favela da Mineira, para passarem uma semana em casa, no aconchego das famílias, há dois anos. Qualquer dotado de poucas luzes saberia que, a partir daí, difícil seria botar novamente os olhos sobre a dupla, que carrega uma dúzia de assassinatos e quase um século e meio de pena por cumprir.
O resultado tem sido estampado pelos jornai s nas últimas duas semanas e soma pelo menos uma dúzia de mortos, ônibus incendiados e centenas de famílias aterrorizadas.
Por mais que a administração penitenciária ateste em relatório o bom comportamento e que o preso tenha cumprido um sexto da pena (um quarto, se for reincidente), só muita ingenuidade, para dizer o mínimo, pode levar um juiz a acreditar que um condenado a 89 anos de cana (como Fu) vai passar uma semana ao sol da liberdade e voltar para cumprir o resto.
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Por que faria isso? Por mais ignorante que seja – e não é o caso – o bandido sabe que, com uma pena desse tamanho, sua vida acabou. Vai morrer na cadeia. A partir daí, qualquer tempo ao ar livre é lucro. Melhor ainda se voltar a ocupar o lugar de chefe da quadrilha.
Por mais discutidos que sejam os critérios para a concessão desse benefício não é desprezível a sensação de que a análise é exclusivamente técnica. Não entrariam na conta a natureza dos crimes cometidos ou a periculosidade do preso. Faz sentido, portanto, a impressão de que o temor de vingança ou represália, em caso de negativa, acompanha todas as etapas do pedido até o resultado.
Apesar disso, a concessão até hoje não foi entregue a um colegiado. Segue na mão de um juiz a quem cabe decidir se uma semana junto da família tornará um sanguinário como Fu bandido melhor. É a ressocialização, mantida mesmo para crimes graves e longas penas. É tão imutável que desconhece até a saída temporária que vira fuga. Nem isso impede novos pedidos.
Mas talvez esteja aí um dos motivos que exigem a revisão da benesse. Se há serias dúvidas quanto à recuperação de um autor de várias mortes e condenado a quase um século de cadeia, imagine-se depois que ele manda uma banana para a Justiça na primeira saída do xadrez.
Asseguram os especialistas que são tão poucos os casos de evasão (em torno de 2%) que não justificariam uma reforma da lei. Talvez sejam realmente, mas a mudança não se impõe pela frequência, e sim pela violência. Se em duas semanas dois reles bandidos retomaram o comando de suas quadrilhas, aterrorizaram a população de quatro favelas e desestabilizaram os fundamentos de um programa de segurança, precisa mais?
O jornalista Xico Vargas mantém a coluna ‘Conversa Carioca’, de segunda à sexta-feira, no jornal ‘BandNews Rio 2a edição’, além da coluna ‘Ponte Aérea’ em xicovargas.uol.com.br.