Foi um domingo histórico, épico, marcante em Porto Alegre. Nenhum adjetivo será suficiente para expor com precisão o que nossa cidade viveu. Eu poderia falar do Brasil, onde dois milhões de brasileiros foram às ruas em mais de 150 cidades – contando por baixo – protestar contra o governo mas também com demandas nobres na quase totalidade. Mas quero falar de Porto Alegre, onde nasci, cresci, onde vivo e converso com as pessoas na rua, no supermercado, no parque, no restaurante. E onde sinto que a cidadania pulsa cada vez mais, de forma desatrelada, independente, sem tutelas ideológicas ou partidárias como em outros tempos. E esta é a grande novidade do 15 de março de 2015.
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Dona Maria, vou chamá-la assim, deve ter uns 80 anos. No meio da multidão, me disse que mora sozinha e vive da parca aposentadoria do INSS. Foi levada por um vizinho. Portava uma bandeirinha do Brasil de plástico. Fez questão de ir, apesar da recomendação médica sugerindo o contrário. Provavelmente não completou o percurso, mas uma frase dela me marcou: “Meu filho, o que fizeram do nosso Brasil!?”
O jovem João, vou assim nominá-lo, tem 22 anos. Portava uma camiseta com os dizeres “impeachment”. Estuda em universidade pública. Contou-me que até uns anos atrás se considerava de esquerda. Mudou radicalmente. Hoje se considera um liberal e luta na sala de aula e nas redes sociais pelos valores que acredita. Uma frase dele é emblemática: “Eu sou jovem. Tenho a vida toda para mudar este sistema podre. E estou disposto a isso.”
Vi também e até foto fiz de um transexual negro, orgulhosamente portando um cartaz “Fora Dilma”. Bravo! Prova que dentre as minorias há muitos brasileiros que não aceitam o pensamento único, a apropriação da liberdade individual por este ou aquele partido, rejeitam a escravidão ideológica. Isto é a verdadeira liberdade que começamos a entender e praticar.
Quem foi às ruas em Porto Alegre não tinha coleira, verbas públicas e não ganhou R$ 35 e um sanduíche de mortadela. O fez por acreditar na sua parcela de responsabilidade pelo que está aí, mas sobretudo para mudar o que está aí. Pudera eu contar um pouco da história de cada uma das 100 mil pessoas que marcharam partindo do Parcão no último domingo. Impossível. Mas saibam elas que já entraram para a história.
O futuro está começando agora. O último domingo foi o prefácio do belo livro que os brasileiros haverão de escrever de agora em diante.
Diego Casagrande é jornalista profissional diplomado desde 1993. Apresenta os programas BandNews Porto Alegre 1a Edição, às 9h, e Ciranda da Cidade, na Band AM 640, às 14h. Escreve no Metro Jornal de Porto Alegre