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Os humanos podem estar relacionados com estes ‘vampiros’ marinhos

As lampreias marinhas têm algumas características que as ligam aos humanos

Lamprea marina
Lampreia marinha

Quando vemos um animal como a lampreia do mar, com um corpo alongado e uma ventosa cheia de dentes afiados, nunca pensaríamos que poderia estar relacionado com os humanos; no entanto, um estudo encontrou uma característica semelhante entre essas duas espécies tão diferentes.

Um novo estudo do Krumlauf Lab do Instituto Stowers de Pesquisa Médica descobriu que o rombencéfalo - a parte do cérebro que controla funções vitais como a pressão sanguínea e a frequência cardíaca - da lampreia marinha e do ser humano é construído com um conjunto de ferramentas moleculares e genéticas extraordinariamente similares.

"A lampreia-do-mar é um membro dos vertebrados sem mandíbula, nossos primos vertebrados mais distantes, que se separaram dos vertebrados com mandíbula há mais de 500 milhões de anos e que carecem de certas características como mandíbulas e membros emparelhados", explicou ao Metro Hugo Parker, pesquisador pós-doutorado associado ao Instituto Stowers de Pesquisa Médica e coautor da pesquisa.

A pesquisa publicada na Nature Communications oferece uma ideia de como evoluíram os cérebros dos animais antigos. A equipe descobriu de forma inesperada que um sinal molecular crucial é necessário em grande medida durante o desenvolvimento do rombencéfalo dos vertebrados.


Assim como outros animais vertebrados, as lampreias marinhas têm coluna vertebral e esqueleto, mas lhes falta uma característica notável na cabeça: a mandíbula. Como a maioria dos vertebrados, incluindo os humanos, tem mandíbula, essa diferença surpreendente das lampreias marinhas as torna valiosos modelos para entender a evolução das características dos vertebrados.

Trabalhos anteriores identificaram que os genes que estruturam e subdividem o rombencéfalo da lampreia marinha são idênticos aos dos vertebrados com mandíbulas, incluindo os humanos.

"Se pensava que, por não ter mandíbula, as lampreias marinhas não tinham o rombencéfalo formado como outros vertebrados", explica o Dr. Robb Krumlauf. "Nós demonstramos que esta parte básica do cérebro é construída exatamente da mesma forma que a dos ratos e até mesmo dos humanos".

As chaves

- É um peixe pré-histórico cuja origem remonta a 500 milhões de anos

- Praticamente não evoluiu

- É um peixe agnato (sem mandíbula)

- É um anádromo, pois vive no mar e se reproduz no rio

- Vive em profundidades de 200 a 400 m

- É um parasita que vive aderido aos peixes e mamíferos

4 perguntas

Hugo Parker, Investigador pós-doutorado associado ao Laboratório Krumlauf

1. Por que se interessou em estudar as lampreias marinhas e sua relação com os humanos?

Uma questão fundamental em biologia evolutiva é como surgem as novidades nos planos corporais dos animais. Entre as novidades importantes dos vertebrados estão um cérebro complexo, órgãos sensoriais pareados, uma mandíbula e membros pareados. Quando e como surgiram essas características? A lampreia do mar pertence aos vertebrados sem mandíbula, nossos primos vertebrados mais distantes, que se separaram dos vertebrados com mandíbula há mais de 500 milhões de anos e que carecem de certas características, como mandíbulas e membros pares. Comparar a embriologia de vertebrados com mandíbula e sem mandíbula nos permite abordar essas questões deduzindo como era o ancestral comum dos vertebrados. Como é mais fácil trabalhar com a lampreia marinha do que com outras espécies de vertebrados sem mandíbula, devido à disponibilidade de embriões, ela nos fornece uma janela única para as primeiras etapas da evolução dos vertebrados.

2. Poderia nos dizer mais sobre o rombencéfalo e sua importância para a pesquisa?

O rombencéfalo é exclusivo dos animais vertebrados e funciona como centro de coordenação de muitas atividades fundamentais do sistema nervoso central, como a respiração, o sono e o controle postural. Durante o desenvolvimento, o rombencéfalo se subdivide em uma série de segmentos, cada um contendo circuitos únicos de neurônios. Esse processo de segmentação é fundamental para a correta formação do cérebro, assim como para o desenvolvimento da complexa cabeça e pescoço das espécies vertebradas. Portanto, o rombencéfalo constitui um importante sistema modelo para compreender os processos genéticos subjacentes à formação do sistema nervoso, ao desenvolvimento da cabeça e à evolução dos vertebrados. Uma característica notável do desenvolvimento do rombencéfalo é que os membros da família de genes Hox são ativados em segmentos específicos e desempenham um papel crucial na formação e função desses segmentos. Outro fator-chave no desenvolvimento do rombencéfalo é o ácido retinóico, que atua como sinal molecular na ativação de genes, incluindo os genes Hox, ao longo do eixo cabeça-cauda.

3. Por que esses monstros marinhos e os humanos estão muito mais relacionados do que se pensava?

- Em lampreias, pesquisas anteriores haviam sugerido que os genes Hox e o ácido retinóico estavam apenas parcialmente associados à segmentação do rombencéfalo, e que o rombencéfalo da lampreia se desenvolvia de forma radicalmente distinta dos rombencéfalos de outros vertebrados. No entanto, nossa pesquisa descobriu uma conservação profunda e detalhada de muitas interações moleculares e processos reguladores que regem a segmentação do rombencéfalo na lampreia e nos vertebrados com mandíbula.

4. Como é que essas descobertas nos ajudam a entender a evolução do cérebro dos vertebrados?

Nossos resultados mostram que o desenvolvimento precoce do rombencéfalo é mais similar do que se pensava entre os vertebrados com mandíbula e sem mandíbula. Isso significa que precisamos olhar mais profundamente no tempo evolutivo para entender quando e como esse circuito genético evoluiu. Também é importante notar que, apesar das semelhanças na formação precoce do rombencéfalo, a neuroanatomia do rombencéfalo adulto difere substancialmente entre parentes distantes, como o rato e a lampreia. Isso sugere que a evolução foi capaz de gerar neuroanatomias diversas a partir de uma base comum. Essas são pistas importantes para futuras pesquisas sobre a evolução do cérebro dos vertebrados.

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